por Wilson Zaidan
“A música é a linguagem que me permite
comunicar com o além.”
Robert Schumann
Em 1810, nascia em Zwickau – cidade ao leste da Alemanha de outrora – o pianista compositor Robert Schumann. Filho do livreiro e editor August Schumann, Robert herdou do pai o gosto pela literatura, principalmente pela poesia. Admirava intensamente obras de Sir. Walter Scott e Jean Paul, e não era difícil o contato com as obras de Shakespeare, que na época, carregava um poder simbólico para os jovens que se rebelavam contra a ortodoxia do classicismo.
Durante a adolescência, Schumann se muda para a cidade de Heidelberg para estudar direito. Em idas e vindas, sob influência de professores, ele entra em contato mais constante e direto com a música e sente-se fascinado ao ouvir pela primeira vez, em 1830 – com seus 20 anos – o diabólico violinista Nicolò Paganini. O ardor em sua alma ficou tão óbvio, que Schumann deixa a faculdade de direito e se muda para a Itália, país que com os resquícios da antiguidade romana, viria ser a “terra prometida” para os jovens românticos.
“Por que se apressar sobre coisas bonitas?
Por que não relaxar e apreciá-las?”
Clara Schumann
Na cidade de Leipizig, onde o compositor tinha aulas de harmonia e composição, conhece a sua terceira e mais avassaladora paixão: Clara Wieck, mulher que compartilhava dos mesmos entusiasmos do compositor: poesia e música.
Juntos, viajaram pela Europa difundindo suas artes. A obsessão pela música e composição começa a tomar conta da mente de Robert Schumann – até mesmo por uma rivalidade vaidosa com a própria esposa – e a dedicação aos exercícios técnicos se torna tão excessiva que o pianista passa a sofrer com limitações na mobilidade de sua mão direita.
Limitado, e ainda procurando por uma fonte de renda (o casal teve oito filhos), Schumann concentra-se na composição e lança uma revista destinada a crítica musical. É então convidado para lecionar piano e composição no Conservatório de Leipzig, mas a condição psíquica do gênio começa a se degradar ao ver seu sonho romântico se transformando em seu grande pesadelo.
“Uma mulher precisa considerar muitas coisas,
especialmente deve manter um certo grau de isolamento,
que é muito difícil quando tem muito amor.”
Clara Schumann
Relações sociais começaram a se tornar um desafio devido ao seu histórico de transtorno mental, e a cada cartada seguida de um fracasso – como a ópera de Genoveva – o desequilíbrio psíquico se agravava. Já à beira da demência, Schumann tenta suicídio no rio Reno, ato que leva a esposa do compositor interná-lo em um hospital psiquiátrico, onde nada além do silêncio reinava pelos grandes corredores. Foi o nono círculo do inferno para uma mente genial, criativa e doente.
Em um de seus últimos suspiros de sanidade mental, Schumman, em carta, escreve para a esposa Clara:
“Diz-me que cuidarás do meu vestuário e se irás mandar-me cigarros.
Tenho tantas coisas para pedir-te e tantos desejos para exprimir… Se conseguisse ver-te e falar contigo durante umas horas… Porém, se quiseres apagar algumas das coisas que pedi, pode fazê-lo. E assim digo-te adeus, minha adorada Clara, a ti e aos meus filhos queridos. Escreve-me depressa. O teu velho e fiel Robert.”
No dia 29 de julho de 1856, aos 46 anos, variando entre a loucura e a sanidade com a mesma turbulenta proporção que variava entre música e poesia, Robert Schumann deixa este mundo para sempre.
Compensa conhecer a obra deste gênio louco apaixonado. “Kreisleriana Fantasia para Piano”, considerada um dos maiores trabalhos do compositor, parece ter conseguido colocar na mesma estrada sua neurose, fantasias e seu mais profundo alcance emocional. Com a enorme capacidade de pegar idéias e abstrações literárias, a peça é inspirada pela biografia de Ernst Theodor Amadeus Hoffman (autor de contos misteriosos e enigmáticos). Além de uma forma retórica, a peça tem uma característica pictórica, onde busca retratar musicalmente um dos personagens dos contos de Hoffman. Nesta mesma peça, fica claro que a rebeldia de Schumann pelo tradicionalismo clássico não de dissipou com o passar do tempo… Ainda que seguindo, de forma contrariada, as diretrizes tradicionais impostas pelo Classicismo, percebe-se nas nuances da peça o espírito jovem e apaixonado (e também perturbado), como alguém que tem muito a dizer, mas não pode e nem consegue fazê-lo.
Kreisleriana, op.16
“Ele ouvia as vozes dos anjos e anotava suas músicas.
Mas logo os anjos se transformaram em demônios.”
– A frase, dita por um amigo do compositor, define aquela que foi a maior batalha de Robert Schumann durante toda a vida: a luta contra a loucura.
Beba na fonte:
Coleção FOLHA de Música Clássica
10º Volume, Schumann
Clara Schumann: compositora X mulher de compositor
de Eliana Monteiro da Silva
Editora Ficções, 2011
Música Clássica
Guia Ilustrado Zahar
de John Burrows
Editora Jorge Zahar, 2006
Coleção Deutsche Grammophon
Música clássica em vinil