Ao verme que primeiro roeu as frias carnes do cadáver de Machado de Assis, dedicamos como saudosa lembrança esta seleção de frases.
Ipsis Litteris:

Memórias Póstumas de Brás Cubas, 1881
“Ao verme que primeiro roeu as frias carnes do meu cadáver dedico como saudosa lembrança estas memórias póstumas”
“Marcela amou-me durante quinze meses e onze contos de réis…”
“Quem escapa do perigo vive a vida com outra intensidade.”
“O melhor prólogo é o que contém menos coisas, ou o que as diz de um jeito obscuro e truncado.”
“O sonho é uma festa do espírito.”
“Matamos o tempo; o tempo nos enterra.”
“Gosto dos epitáfios; eles são, entre a gente civilizada, uma expressão daquele pio e secreto egoísmo que induz o homem a arrancar à morte um farrapo ao menos da sombra que passou.”
“Não tive filhos, não transmiti a nenhuma criatura o legado da nossa miséria.”
Dom Casmurro, 1899
“A insônia, musa de olhos arregalados, não me deixou dormir uma longa hora ou duas; as cócegas pediam-me unhas, e coçava-me com alma.”
“Conhecia as regras do escrever, sem suspeitar as do amar; tinha orgias de latim e era virgem de mulheres.”
“Não nos censures, piloto de má morte, não se navegam corações como os outros mares deste mundo.”
“Purgatório é uma casa de penhores, que empresta sobre todas as virtudes, a juro alto e prazo curto.”
“A mentira é muita vez tão involuntária como a respiração.”
“Aos quinze anos, tudo é infinito.”
“A vida é cheia de obrigações que a gente cumpre por mais vontade que tenha de as infringir deslavadamente.”
“A imaginação foi a companheira de toda a minha existência, viva, rápida, inquieta, alguma vez tímida e amiga de empacar, as mais delas, capaz de engolir campanhas e campanhas, correndo.”
O Alienista,1882
“A loucura, objeto dos meus estudos, era até agora uma ilha perdida no oceano da razão; começo a suspeitar que é um continente.”
“Mas a ciência tem o inefável dom de curar todas as mágoas.”
“O principal nesta minha obra da Casa Verde é estudar profundamente a loucura, os seus diversos graus, classificar-lhe os casos, descobrir enfim a causa do fenômeno e o remédio universal. Este é o mistério do meu coração. Creio que com isto presto um bom serviço à humanidade.”
Esaú e Jacó, 1904
“Que os segredos, amiga minha, também são gente; nascem, vivem e morrem.”
“Um viúvo sem filhos vale por um solteirão; aos sessenta, vale por dois ou três.”
“Não é a ocasião que faz o ladrão, dizia ele a alguém; o provérbio está errado. A forma exata deve ser esta: ‘A ocasião faz o furto; o ladrão nasce feito.'”
“Não é a verdade que vence, é a convicção.”
Memorial de Aires, 1908
“Tudo é possível debaixo do sol –e a mesma coisa sucederá acima dele – Deus sabe.”
“Não há alegria pública que valha uma boa alegria particular.”
“Uma coisa é citar versos, outra é crer neles.”
Crisálidas, 1864
“Para eu amar-te devias
Outra ser e não como eras.”
Helena, 1876
“O casamento é a pior ou a melhor coisa do mundo; pura questão de temperamento.”
“O melhor modo de viver em paz é nutrir o amor-próprio dos outros com pedaços do nosso.”
“Mas, onde cessava ali a realidade e começava a aparência? Vinha de tratar com um infeliz ou um hipócrita?”
Quincas Borba,1891
“O maior pecado, depois do pecado, é a publicação do pecado.”
“Ouça-me este conselho: em política, não se perdoa nem se esquece nada.”
“A moral é uma, os pecados são diferentes.”
Iaiá Garcia,1878
“Alguma coisa escapa ao naufrágio das ilusões.”
“O acaso propusera-lhe um enigma; o tempo dava-lhe a decifração.”
“Quando estimo alguém, perdôo; quando não estimo, esqueço. Perdoar e esquecer é raro, mas não é possível; está nas tuas mãos.”
“Das qualidades necessárias ao xadrez, Iaiá possuía as duas essenciais: vista pronta e paciência beneditina, qualidades preciosas na vida, que também é um xadrez, com seus problemas e partidas, umas ganhas, outras perdidas, outras nulas.”
Contos
“Está morto: podemos elogiá-lo à vontade.”
Em “O empréstimo” (1881)
“–Que importa o tempo? Há amigos de oito dias e indiferentes de oito anos.”
Em “Ressurreição” (1872)
“A valsa é a primeira dança do mundo; pelo menos é a única dança em que há poesia.”
Em “Ressurreição” (1872)
“Esquece-se o real e palpa-se o impossível.”
No prelúdio de “Falenas” (1870)
“O presente que se ignora vale o futuro.”
Em “A Cartomante”, em “Várias Histórias” (1896)
“O dia estava lindíssimo. Não era só um domingo cristão; era um imenso domingo universal.”
Em “Uns Braços”, “Várias Histórias” (1896)
“Eu sei que vossa excelência preferia uma delicada mentira; mas eu não conheço nada mais delicado que a verdade.”
Em “Linha Reta e Linha Curva”, “Contos Fluminenses” (1870)
“Variar é viver. São dois verbos que começam com ‘v’: profunda lição que nos dá a natureza da gramática.”
No conto “Não é o Mel para a Boca do Asno” (1868)
“Não confunda o romance com a vida, ou viverá desgraçada.”
Em “Ponto de vista”, em “Histórias da Meia-Noite” (1873)
Crônicas
“Não seria propriamente um efeito de arte, concordo, e sim da natureza; mas que é a natureza senão uma arte anterior?”
Em “A Semana” (18 de novembro de 1894)
“O inferno é um hospício de incuráveis.”
Em “A Semana” (18 de fevereiro de 1894)
“Em si mesma, a loucura é já uma rebelião. O juízo é a ordem, é a constituição, a justiça e as leis.”
Em “A Semana” (17 de janeiro de 1897)
“O que importa notar é que todas essas multidões de mortos –por uma causa justa ou injusta– são os figurantes anônimos da tragédia universal e humana.”
Em “A Semana” (23 de fevereiro de 1896)
“Quando a gente não pode imitar os grandes homens, imite ao menos as grandes ficções.”
Em “A Semana” (19 de novembro de 1893)
“As coisas têm o valor do aspecto, e o aspecto depende da retina.”
Em “A Semana” (22 de novembro de 1896)
“Em uma terra onde tudo está por fazer, não seria o teatro, cópia continuada da sociedade, que estaria mais adiantado.”
Em “A Semana” (1º de dezembro de 1861)
“O boato é um ente invisível e impalpável, que fala como um homem, está em toda a parte e em nenhuma, que ninguém vê de onde surge, nem onde se esconde, que traz consigo a célebre lanterna dos contos arábicos, a favor da qual se avantaja em poder e prestígio, a tudo o que é prestigioso e poderoso.”
Em “A Semana” (7 de janeiro de 1862)
“Antes do poeta mostra-se o homem, antes do talento o caráter.”
Em “A Semana”, (26 de janeiro de 1862)
“Um dos defeitos mais gerais, entre nós, é achar sério o que é ridículo, e ridículo o que é sério, pois o tato para acertar nestas coisas é também uma virtude do povo.”
Em “Ao Acaso” (28 de março 1865)
“Encha uma pequena mala com ideias e frases feitas, se puder, abençoe o rapaz e deixe-o ir.”
Em “Balas de Estalo” (3 de abril de 1885)
“Venha, venha o voto feminino; eu o desejo, não somente porque é idéia de publicistas notáveis, mas porque é um elemento estético nas eleições, onde não há estética.”
Em “Histórias de 15 Dias” (1º de abril de 1877)
“Não se comenta Shakespeare, admira-se.”
Em “Revista dos Teatros”, crítica teatral, (12 de novembro de 1859)
“Longe de educar o gosto, o teatro serve apenas para desfantasiar o espírito, nos dias de maior aborrecimento.”
Em “Crítica Teatral” (1866)
Compensa:
Machado de A a X – Um Dicionário de Citações
de Lucia Leite Ribeiro Prado Lopes, ilustrado por Angelo Agostini
Editora 34, 2001
Pensamentos e Reflexões de Machado de Assis
de Gentil de Andrade
Editora Civilização Brasileira, 1990
Coluna: Ipsis Litteris