O sedentário, o turista e o andarilho

Pensemos, pois, a partir destes três personagens: em nossa vida do dia-a-dia, em nosso modo de encarar o mundo, somos sedentários, turistas ou andarilhos?

Eu não tenho paredes, só tenho horizontes.

Mário Quintana

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Nascer da Lua sobre o Mar, Caspar David Friedrich, 1822

 

Neste breve texto, proponho uma reflexão por meio de uma analogia entre “visão de mundo” e “deslocamentos geográficos”.

Em tempos de julgamentos apressados, faz-se preciso avisar que se trata de uma alegoria, ou seja, não afirmo que a cosmovisão de determinado sujeito estaria vinculada aos locais por ele visitados. Ressalva feita, partamos para a analogia.

Vejamos, primeiro, o sedentário. O sedentário é aquele que nunca viaja, pouco sai da própria casa. Para ele, seu território é sagrado e o que foge de sua rotina assusta-o consideravelmente. O sedentário tem aversão ao que é transitório, ao que é passageiro, a tudo o que promove mudança. Sua proposta é conservar a vida: horários, costumes, gestos. Incomoda-o, inclusive, a alteração da disposição dos móveis e as visitas sem aviso.

Depois, temos o turista. O turista, de modo geral, organiza sua viagem por meio de uma agência, sabe o que vai fazer e aonde vai se hospedar. Tem toda a viagem planejada e se irrita se algo sai diferente do plano inicial. Não sai do hotel sem GPS ou mapas. Não deixa uma cidade sem visitar seus cartões postais e adora fotografar cada detalhe da viagem.

Por fim, emerge o andarilho. O andarilho se desloca de forma independente, hospeda-se geralmente em albergues para estabelecer contato com pessoas de diversos lugares do mundo. Não tem como preocupação central conhecer os pontos turísticos da cidade.
Ao contrário: quer “infiltrar-se” nos costumes, conversar com os nativos, viver intensamente a cultura local. Não tem horários fixos nem participa de passeios e excursões. Também não se ocupa em fotografar exaustivamente os locais, já que o importante é fixado na memória. O orçamento é modesto e a duração da viagem é incerta. O rumo que vai tomar depende do que vai encontrar pelo caminho.

Pensemos, pois, a partir destes três personagens: em nossa vida do dia-a-dia, em nosso modo de encarar o mundo, somos sedentários, turistas ou andarilhos?

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O Errante Sobre o Mar de Névoa, Caspar David Friedrich, 1818

 

Matheus Arcaro é mestrando em filosofia contemporânea pela UNICAMP. Pós-graduado em História da Arte. Graduado em Filosofia e em Comunicação Social. É professor, palestrante, artista plástico e escritor, autor do romance “O lado imóvel do tempo” (Patuá, 2016) e dos livros de contos “Violeta velha e outras flores” (Patuá, 2014) e “Amortalha” (Patuá, 2017).

 

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